Ex-sócios da União Zoófila acusam a direcção da associação de gestão danosa, peculato e crime fiscal. Em causa está a criação de uma entidade paralela para onde terão sido desviadas verbas de quotas e donativos, para fugir às dívidas ao Estado e outros credores, refere a Lusa.
Nas últimas décadas, a União Zoófila (UZ) recebeu várias heranças como contas bancárias, jóias, barras de ouro, apartamentos e até um prédio numa zona nobre da capital.
Mas a associação manteve sempre as campanhas de angariação de fundos e os anúncios públicos de crise financeira.
«O mistério está aqui: a UZ tem quase 30 mil sócios, a receita da clínica, a venda de andares doados, mas o dinheiro desaparece todo», disse Artur Chaves, ex-sócio que chegou a ser presidente da mesa da Assembleia-Geral e membro da comissão administrativa em 1998. Depois de décadas de trabalho, saiu da direcção, deixou de ser sócio e até o voluntariado abandonou, alegando não ser «conivente com o que se passava».
A Lusa teve acesso a documentos que provam a venda, entre 1999 e 2004, de quatro bens herdados: um apartamento na Amadora, dois em Lisboa e um prédio em Belém. Além dos imóveis, a UZ recebia quotas de sócios e foi angariando donativos das mais diversas formas, como um concerto na Aula Magna, que rendeu 7.500 euros, ou um programa de um concurso televisivo, que deu mais de 14 mil euros em prémios.
Para a ex-sócia Carmen Carvalho, o «mistério» é simples de desvendar: «é o resultado da gestão danosa e da delapidação do património». Carmen aponta, por exemplo, a venda do prédio em Belém por 40 mil euros.
Presidente nega acusações
A actual presidente da associação, no cargo desde final de 2006, nega as acusações. Luísa Barroso garante que o dinheiro angariado é canalizado para pagar a alimentação e tratamento de cerca de 700 animais.
Principal alvo das acusações, a presidente da associação entre 1998 e 2006, Margarida Namora, lembra que quando tomou posse «havia dívidas de quase 60 mil contos».
No entanto, as explicações não convencem Artur Chaves. «Nunca soube para onde é que ia o dinheiro. Mas fui-me apercebendo que ia para todo o lado menos para os cofres».
Durante vários anos, os fundos foram depositados numa conta de uma organização criada em 2001 pela direcção: a Associação Zoófila Portuguesa (AZP). Cheques passados à UZ eram arrecadados numa conta no BPI, em nome da AZP.
O ex-tesoureiro da União Zoófila que se demitiu este Verão diz tratar-se de «detalhes de tesouraria». Uma fonte da AZP envolvida no processo tem outra explicação.
«Todo o dinheiro que entrava na UZ era transferido para a conta da AZP, criada para garantir que nunca haveria nada para penhorar», revela aquela fonte.
Dívidas à Segurança Social, Finanças e EPAL
Entre as entidades públicas que aguardavam o pagamento estava a Segurança Social, as Finanças, o Tribunal de Trabalho e a EPAL.
O ex-tesoureiro admite que alguns pagamentos em falta «prescreveram», mas assegura que a maioria foi paga. «Quando abandonei a associação, a dívida era de 100 mil euros», garante Jaime de Matos.
Para provar que o «dinheiro foi arrecadado de forma legal», o ex-tesoureiro diz que a PJ investigou durante onze meses as ligações entre as duas associações e que o processo foi arquivado.
Mas fonte da AZP contou que as duas direcções entregaram à PJ documentos forjados, para justificar as constantes movimentações de dinheiro.